Maternidade é uma vidraça quebrada.


A ruptura na idealização da maternidade é uma dor que liberta. 


Quando um filho nasce jogamos em suas mãos, na melhor das intenções, um rascunho de uma história que não lhe cabe e nem encaixa. Lançamos expectativas, sonhos aos quais achamos que irão preencher a vida de sentido, mas, na realidade, usamos para todos esses ‘desejos’ o nosso filtro pessoal, porém cada um nasce com o seu exclusivo e, também, chega aqui com uma bagagem que a nossa capacidade humana não consegue entender.


Nossa ideia de maternidade é como se fosse uma vidraça, com uma imagem linda e um colorido único e, paradoxalmente, para o nosso bem ela é quebrada ao longo da vida. Algumas são estilhaçadas no nascimento seja por alguma questão desconhecida, necessidade especial as idealizações são despedaçadas logo que o ‘pacotinho’ chega nas nossas mãos. O ‘luto’ vem, os sonhos se vão, e o medo do desconhecido se apodera. E, para aquela mãe/pai, será o ‘fim do mundo’? Ainda que pareça, não é. Isso acontece, para nos libertar e mostrar que somos apenas cuidadores daquele ser e devemos nos comportar como tal. O Criador em Sua infinita bondade permite que os vidros se quebrem para que possamos entrar em contato com uma realidade e planos infinitamente maiores do que a nossa pobre capacidade idealiza. E, esse romper permite que a criança viva e se apodere da sua própria história.  Qualquer um que tem a oportunidade de ver o crescimento de alguém entende que as peças do ‘quebra-cabeça’ vão se encaixando e a imagem individual de cada um vai formando. Por isso, que às vezes, é tão difícil enxergar no filho as suas próprias questões, que todos têm sem exceção, porque queremos ver aquilo que idealizamos e não a realidade. E, quando ‘insistimos’ em não ver os problemas vão se intensificando até ficar insustentável, e é aí que o vidro se rompe. Vidraça não tem vida, portanto, a imagem pode até ser deslumbrante, mas não é viva é estática, não condiz com nosso mundo que é flexível e mutável. Só conseguimos ‘trabalhar’ com aquilo que é real, enfrentando os desafios que chegam até nós. E, o mais 'presunçoso' é que achamos que iremos ajudar alguém, na ilusão medíocre da maternidade, aqui está mais um grande engano, quando alguma imagem é despedaçada a verdade entra, o diamante que está bruto, e é feio, tem a oportunidade de ser lapidado e nosso mundo que estava limitado por aquela imagem sem movimento, ganha um sopro de vida, o ar entra, o horizonte amplia e o que víamos de forma restrita, como peixes em um aquário, agora somos jogados no oceano das oportunidades. Claro que tudo isso não é fácil, mas é catártico e enriquecedor.


Só podemos vivenciar a maternidade quando desenvolvemos a nossa própria e exclusiva, por isso, o que serve para um, não faz sentido para o outro. Entretanto, quando a vidraça é quebrada, é necessário limpar, recolher e jogar fora os vidros. Ou seja, primeiro precisamos ‘quebrar, romper’ nossas limitações pessoais. ‘Limpar’, dentro de nós, aquilo que não é nosso e só está lá para ser ‘bonito aos olhos do outro’ como moda comportamentais, status, o que todos fazem, crenças que nos amarram. ‘Recolher e jogar fora’ os ‘cacos’ que são questões, ideologias que nos fazem ruminar, machucando com imagens mentais em um mundo mentiroso de “e se fosse assim”, e que não faz mais sentido carregar, pois são só vidros inerte, de materiais baratos e de impossibilidades sem vida. Quando jogamos fora tudo isso, somos livres e libertamos o outro para ser ele mesmo, entregamos em suas mãos materiais, ou seja, possibilidades em que poderá ser a sua versão original, exclusiva e real.


Comentários

  1. Que texto maravilhoso. A maternidade é uma viagem pra dentro de nós mesmos, vem pra extrair o melhor de nós, e lançar fora o que não é pra ficar.

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